terça-feira, 13 de setembro de 2011

entro no metro, saio em s. sebastião. desço a rua, a que passa no CAM, que se dirige à avenida de berna. entro pela entrada lateral dos jardins. primeiro vagueio um pouco pelos caminhos labirínticos. descubro sempre um novo. depois encontro a zona verde, escolho um bocado de chão, preferencialmente com vista para o lago. estendo o lenço, sento-me. ou deito-me. é encosta, é sempre algo desconfortável. a relva compensa. agarro o livro, o mp3 ou a vontade de descansar e de me sentir em paz com o mundo. usufruo do tempo, uso-o para meu prazer pessoal. levanto-me, estou saturada. ou simplesmente cansada de estar parada. saio do jardim, agora por outro caminho - não gosto de repetir caminhos. sigo a mesma rua, que lá em cima se encontra com a fontes pereira de melo. caminho devagar, absorvendo o que de físico e transcendente me rodeia. respiro fundo, apesar de ser os carros o que respiro. desço a fontes pereira de melo, que se encontra com o marquês, que curva para a avenida com maiúscula. na avenida respiro novamente, agora com mais prazer. na avenida é sempre mais de noite que no resto da cidade. o sol não entra com facilidade, mas não deixa de ser luminosa. suspeito que tenha luz própria. desço controlando os passos, que a descida é íngreme. saboreio o ambiente, as pessoas, a ostentação de riqueza e cultura. paro possivelmente no cinema s. jorge, para apurar os novos postais, ou as possíveis programações. chego aos restauradores, aprecio as graduais diferenças espaciais, ambientais, pessoais que a cidade vai adquirindo na jornada. tenho passe da carris, subo com o ascensor. em cima, encontro-me com o miradouro. paro escuto olho. mais que olhar, sonho. vejo o que não está. o que pode estar. vagueio no pensamento. este passa pelo tejo, sé, castelo, graça e perde-se nas altas urbanizações longínquas, não deixando de dar um pulo ao hard rock, ao rossio, à imaginação. tomo decisões, tiro conclusões, rio da e com a vida. sigo caminho, absorvendo mais um pouco de mundo. subo e encontro-me comigo. a minha outra metade, o meu real príncipe. não me dirijo imediatamente ao jardim. corto numa rua à esquerda, embrenho-me, perco-me e encontro-me, vagueio ao acaso, no cerne do príncipe real, como se já o conhecesse desde criança. deixo-me envolver por cada raio de sol, por cada pedra da calçada, por cada cruzamento onde a decisão ditará o que descobrir de seguida. subo então, entro no jardim, respiro-o. passos bem lentos, observo cada movimento d'outréns, os homens a jogar cartas, as mulheres na amena cavaqueira, as crianças nos baloiços e escorregas, os pais na sua atenção natural. sorrio internamente a todos, como se me pertencessem, como se os compreendesse. talvez me sente também, talvez escreva algo. talvez sinta algo, talvez decida algo. continuo caminho, o tempo não pára, apesar de não lhe sentir um gesto sequer. olho à distância o orpheu, olho a vontade de entrar, de conhecer, de sentir. noutro dia. desço a d. pedro v, s. pedro d'alcântara, misericórdia. repito parte do caminho, não gosto, não tenho outra escolha. absorvo cada pedaço de chão pisado, cada inspiração dada. talvez pare novamente no miradouro, não me canso. no camões apanho o vinte e oito eléctrico. gosto de andar de eléctrico, particularmente nos antigos, particularmente nas ruas estreitas, particularmente à noite. tenho passe, não pago. gosto das janelas sem janela, o vento bate-me, despenteia-me, mas eu gosto. delicio-me com a velocidade inconstante, com as ruas escuras, com as curvas apertadas, com as pessoas vagarosas nos seus passeios. há sempre algum estrangeiro no eléctrico, eu pergunto-me o que o levou aqui. sem preconceito, apenas curiosidade. desce, sobe, augusta, ruas cujo nome desconheço, sé, miradouro, sta. luzia, castelo, saio. talvez suba até ao castelo, talvez diga que sou residente, talvez não pague e entre, e me perca na paisagem, no cenário, nas mil escadas e mil recordações. talvez reflicta sobre o passado, o meu e o daquele espaço ancião. canso-me, saturo-me, saio, sigo caminho. ruas cujo nome desconheço, é sempre em frente. chego à graça e ao seu primeiro miradouro, encontro-me com algumas recordações, boas. rio-me de algumas, sorrio para mim. faço uma curta e rápida rebobinagem à minha vida, gostei do que vivi. prossigo, agora até ao segundo miradouro. o mais elevado e vistoso da cidade. a subida é íngreme. chego, perco-me em mais recordações, sabendo que estou a construir novas. respiro a cidade, até ao mais profundo dos meus pulmões. olho cada milímetro, integro-o bem no meu âmago.
estou em casa.




Tu estás longe e quem sofre sou eu.
Pelas pedras da tua calçada eu dancei.
Minha Lisboa.


Silence is a boy -"Lisboa" from MPAGDP on Vimeo.

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